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"Seria justo" repetir aumento extra das pensões mais baixas
27-10-2024 21:33
A TRAGÉDIA DA COVA DA MOURA
- O título de um artigo do ex-diretor do Público, Manuel Carvalho, sintetiza bem este caso: "a morte por explicar e a violência sem explicação".
- A morte do jovem Odair Moniz é uma tragédia ainda por explicar: houve ou não excesso de legítima defesa? A ação da PSP foi ou não proporcional? Temos que aguardar pelas conclusões do inquérito. Não nos podemos substituir às autoridades. Por isso é que há Inspeção Geral da Administração Interna (IGAI), Polícia Judiciária (PJ), Procuradoria-Geral da República (PGR) e Estado de direito.
- A violência que se seguiu não tem desculpa possível.
- As pessoas têm todo o direito a protestar: exigindo, reclamando, reivindicando, fazendo manifestações pacíficas, como sucedeu ontem. Tudo o que é legítimo em democracia.
- Mas o que vimos no início da semana não foram protestos. Foram crimes. Crimes contra a ordem pública. Contra a paz social. Contra a segurança de pessoas e bens. Crimes cometidos por uma minoria contra a maioria das pessoas, silenciosas e tranquilas, que vivem nos bairros vandalizados.
- Apesar disso, a perceção pública, nos dois primeiros dias, é que o Estado falhou: as forças de segurança não foram eficazes, nem na ação nem na comunicação. O que se viu na rua não foi segurança e autoridade. Depois, a situação melhorou. Ainda bem. Precisamos de forças de segurança eficientes e credíveis.
- Finalmente, a dimensão política. A generalidade dos partidos esteve bem, falando com responsabilidade. Desde logo o PCP, que foi institucional e correto. Já o BE e o Chega são de um radicalismo intolerável. Para o Bloco, a intervenção da PSP foi um ato racista. Conclusão tirada sem investigação e sem provas. Não é aceitável. Com o Chega, é ainda muito pior: o homem abatido era um bandido e a PSP até devia matar mais para garantir a ordem. São declarações inqualificáveis. Nem numa taberna se dizem. Muito menos na televisão, por parte de um dirigente político. É a indecência institucionalizada. A piromania na política. Mais do que a punição penal, merecem a punição da sociedade.
SEGURANÇA E INTEGRAÇÃO SOCIAL
- A questão da violência urbana deve levar a duas reflexões: sobre a segurança e sobre a integração social. Já em julho o disse: há um aumento da insegurança nas Áreas Metropolitanas de Lisboa e Porto. Na altura, o Comando da PSP veio dizer que era negativo haver mais polícias na rua. E a MAI deu cobertura a estas declarações. Dois disparates.
- Os números do último Relatório da Segurança Interna são claros:
- Os crimes violentos aumentaram em 2022 e 2023. No ano passado, a criminalidade grupal aumentou em cerca de 15%. A delinquência juvenil agravou-se em quase 9%. As apreensões de droga aumentaram 13,6%.
- O problema é sério, sobretudo, na Grande Lisboa e no Grande Porto. E a realidade é provavelmente mais grave que a retratada nos números. Há pessoas que não fazem queixa às autoridades.
- Assim sendo, há quatro questões que se impõe resolver:
- Haver mais policias na rua. Para dissuadir e prevenir o crime.
- Haver mais videovigilância. Um instrumento essencial.
- Haver mais Ministra da Administração Interna. Tem havido pouco. Não houve nos fogos. Não houve agora. Como não é tempo de remodelações, convém haver então mais apoio a esta Ministra.
- E é preciso institucionalizar o diálogo do governo e das próprias forças de segurança com as autarquias e as associações de moradores dos bairros sociais. Criar um órgão consultivo com estas quatro entidades, para um diálogo permanente, era avisado. Segurança é importante. Maior coesão social é decisiva.
MAIS ECONOMIA, MENOS DÍVIDA
- Numa semana de vários factos negativos, também tivemos informações positivas. A poucos dias do debate orçamental, há duas informações especialmente relevantes, vindas do FMI:
- A primeira, sobre a economia. Segundo o Fundo, Portugal vai crescer no próximo ano ainda mais do que o governo prevê (2,3%). Atendendo a que a Europa está estagnada, este dado novo tem bastante significado.
- A segunda, ainda mais importante, sobre a dívida. Segundo o Fundo, Portugal conseguirá, já em 2026, estar melhor que a média europeia em relação ao peso da dívida no PIB. E, em 2029, reforçará essa melhoria, afastando-se dos países mais endividados. É uma grande noticia.
Há poucos anos, o que se discutia em Portugal era a necessidade de renegociar a dívida, tal era a preocupação com a sua dimensão. Poucos anos depois, a situação inverteu-se. Grande mérito de Fernando Medina. E do atual Governo, que nesta parte prossegue a política que vinha de trás.
- Na mesma semana em que houve Cimeira Luso-Espanhola – com acordos importantes sobretudo no domínio da água – veio a saber-se que uma grande empresa espanhola saiu de Espanha para investir em Portugal, por causa dos novos impostos sobre a energia no país vizinho.
- O que nos reconduz à reflexão sobre a importância de ter impostos competitivos. Agora, foi Portugal a beneficiar de impostos altos em Espanha. No futuro, podem ser os países de Leste Europeu a beneficiar com novos investimentos, pelo facto de terem impostos mais baixos que Portugal.
AUMENTO DAS PENSÕES
- Passando da macroeconomia para a vida das pessoas, há também boas notícias a assinalar sobre os rendimentos de pensionistas e reformados. São cerca de três milhões de portugueses interessados.
- Assim, importa destacar:
- O valor das atualizações de pensões para 2025 está basicamente definido. Um aumento de 3,1% para as pensões até 1018 euros (até 2 IAS); e um aumento de 2,6% para as pensões que variam entre 1018 e 3055€ (de 2 a 6 IAS). Nestes dois escalões está a esmagadora maioria das pensões em Portugal.
- Desta forma, garante-se um efetivo ganho de poder de compra dos pensionistas em 2024 e 2025. Um exemplo: no primeiro escalão (onde está a grande maioria dos pensionistas) o valor acumulado das duas atualizações será de 9,1%. No mesmo período, o valor acumulado da inflação será de 4,9%.
- Mesmo assim, nos aumentos para 2025, há uma questão que importa refletir e que o Governo deveria ponderar: um aumento de 3,1% para pensões muito baixas é um aumento muito reduzido. Cobre a inflação, é verdade, mas é muito pouco. É a fórmula da lei, é um facto, mas é um aumento muito curto. No passado, desde 2017, houve um aumento extraordinário de 10 Euros para as pensões mais baixas, o qual somava ao aumento legal. Pergunto: não seria justo repetir agora essa medida? Penso que sim. Além do mais, a Segurança Social vai ter um enorme excedente e o combate á pobreza também passa por apoiar os pensionistas mais vulneráveis.
ELEIÇÕES AUTÁRQUICAS
- Prestes a terminar a novela orçamental, o novo desafio político vai acelerar: a preparação das eleições autárquicas de setembro de 2025. Umas autárquicas que podem ser muito imprevisíveis. Provavelmente, as eleições autárquicas mais imprevisíveis dos últimos anos.
- Há três fatores que contribuem muito para esta imprevisibilidade:
- Primeiro, a erosão do PCP. O partido está há anos em queda no plano autárquico. O mais provável é que este fenómeno de erosão possa acentuar-se. O que pode levar o PCP a perder Câmaras importantes. Évora e Setúbal á cabeça. Mas não serão as únicas.
- Segundo, o efeito do Chega. É outro fator imprevisível. Não é líquido que o Chega possa ganhar presidências de Câmaras. Mas as suas candidaturas vão "roubar" votos às candidaturas do PSD e do PS e fazer perder-lhes algumas eleições.
- Terceiro, a consequência da renovação. Há cerca de 1/3 de Presidentes de Câmaras que não podem candidatar-se. Atingiram o limite de mandatos. São, sobretudo, autarcas do PS e do PSD. Este é um outro fator de imprevisibilidade. Pode levar a mudanças inesperadas e à abertura de novos ciclos políticos locais.
- Neste quadro, há seis casos que poderão ser especialmente desafiantes: primeiro, Lisboa, porque é a capital; segundo, o Porto, onde termina o ciclo de um independente e se vai voltar ao ciclo clássico, PSD ou PS; terceiro, Coimbra, onde o PS terá uma candidatura forte (Ana Abrunhosa); quarto, Setúbal, onde a candidatura da ex-Presidente da Câmara reforça a imprevisibilidade desta eleição; quinto, Sintra, onde a saída de Basílio Horta pode estimular a candidatura de um peso pesado do PSD; finalmente, Évora, onde a mudança é muito provável. Só falta saber se beneficia mais o PS ou o PSD. Esperam-se grandes surpresas.
ÉVORA 27: CAPITAL EUROPEIA DA CULTURA
- Esta semana tem um certo caráter histórico: arrancou finalmente a caminhada para se celebrar em 2027 o acontecimento Évora, Capital Europeia da Cultura. É a quarta vez que tal acontece em Portugal, por decisão da União Europeia: após Lisboa em 1994; Porto em 2001; e Guimarães em 2012. Poucos países têm o privilégio de quatro efemérides culturais desta natureza em apenas três décadas.
- Esta distinção é uma homenagem a uma cidade e a uma região.
- Homenagem a Évora, uma cidade cheia de história, de cultura, de hospitalidade e monumentalidade;
- Homenagem ao Alentejo, uma região com características singulares no contexto do país e da Europa. Entre as quais o "vagar", lema deste projeto.
- Num contexto de tanta polarização política, há um outro facto distintivo a enaltecer: um acordo improvável entre o Governo da AD e a Câmara da CDU para a escolha da líder do projeto Évora 27: Maria do Céu Ramos, uma mulher sóbria, competente e culta.
- Numa boa semana para a cultura, a cidade de Penafiel, no Norte do País, esteve igualmente em alta com o seu Festival Literário ESCRITARIA, dedicado ao poeta e artista brasileiro Arnaldo Antunes. É o poder local a promover a cultura.